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Direito previdenciário / 11 de abril de 2019
A reforma da previdência e as mudanças propostas no benefício de prestação continuada (BPC/LOAS)

O benefício de prestação continuada (BPC) compõe o sistema de assistência social criado pela Constituição Federal de 1988, visando garantir o pagamento mensal de um salário mínimo à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

Atualmente, pode acessar o benefício qualquer brasileiro, nato ou naturalizado, desde que comprove residência fixa no Brasil e renda por pessoa do grupo familiar inferior a ¼ de salário mínimo (em 2019, essa fração equivale a R$ 249,50).


Também devem ser preenchidas as seguintes condições: 

a) Para o idoso: idade igual ou superior a 65 anos (homem ou mulher);

b) Para a pessoa com deficiência: qualquer idade, devendo comprovar impedimentos de longo prazo (mínimo de dois anos) de natureza física, mental, intelectual ou sensorial;

 

O BPC, previsto no art. 203 da Constituição, atualmente é disciplinado pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (Lei nº 8.742/1993).

Segundo o Boletim Estatístico da Previdência Social (BEPS) de novembro de 2018, há 4,7 milhões de beneficiários do BPC no Brasil, dos quais 56% são portadores de deficiência e 44% são idosos acima de 65 anos. Esse total equivale a pouco mais de 13% do total de benefícios concedidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

A regra proposta na PEC nº 6 de 2019 (reforma da previdência) altera a idade, para concessão do BPC ao idoso, de 65 para 70 anos de idade. Prevê, além disso, a possibilidade de concessão do benefício a pessoas que se enquadrem nos mesmos critérios, mas que tenham entre 60 e 69 anos. Neste caso, porém, o valor do benefício foi fixado em R$ 400,00 - ou seja, somente a partir dos 70 anos o idoso terá direito à percepção de um salário-mínimo.

Importante ressaltar que não há, no texto legal, qualquer previsão de reajuste desse valor. O novo benefício está disciplinado nas disposições transitórias da PEC nº 6/2019 e pode ser alterado por meio de Lei Ordinária. O próprio texto prevê, ainda, possibilidade de ajuste das idades mínimas, quando houver aumento na expectativa de sobrevida da população brasileira.

A proposta também acrescenta novo critério para aferição da condição de miserabilidade do beneficiário do BPC. Essa alteração alcança tanto o benefício devido ao idoso quanto ao deficiente.

Além do requisito que exige renda mensal per capita familiar inferior a ¼ do salário-mínimo, já previsto, o patrimônio familiar deverá ser inferior a R$ 98.000,00. Se a família tiver imóvel que não seja da faixa mais básica do Programa “Minha casa Minha vida”, já ultrapassará esse valor, não cumprindo um dos requisitos exigidos para a concessão do benefício. Trata-se, portanto, de critério rigorosíssimo, que exclui diversas pessoas que dependeriam do benefício para sua manutenção e sobrevivência.

Outra alteração significativa diz respeito ao cálculo da renda familiar. Pela regra proposta, o valor da renda mensal recebida a qualquer título (incluindo o próprio BPC) por membro da família do requerente integrará a renda mensal per capita familiar.

Atualmente, o Estatuto do Idoso (Lei nº 8.742/93) permite a exclusão de benefícios recebidos por outro membro da família, também idoso. Além deste, é possível estender a exclusão ao deficiente que recebe amparo previdenciário ou assistencial, no valor de até um salário mínimo.

Se, por exemplo, uma família conta com dois membros elegíveis pela regra vigente, ambos têm direito ao pagamento do benefício, desde que atendidos todos os requisitos. É que a renda recebida pelo primeiro membro idoso não aumentará a renda familiar considerada para fins de concessão do benefício ao segundo membro.

Pela proposta apresentada, contudo, o segundo membro apenas se tornará elegível se, somando a renda do BPC recebida pelo primeiro membro à renda familiar, o critério de renda familiar per capita inferior a ¼ de salário mínimo também for satisfeito.

Assim, se em determinada família houver apenas dois membros, não será possível que ambos recebam o benefício.

As mudanças nas regras para a concessão do BPC é um dos pontos que geram maior atrito entre o governo e o Congresso Nacional. Líderes de 13 partidos já anunciaram que barrarão mudanças no BPC e na aposentadoria rural propostas pela Reforma da Previdência.

Por isso, na contramão daquilo que defende o governo, no dia 03 de abril de 2019, a Comissão de Assuntos Sociais do Senado aprovou projeto de lei (PLS 374/2018) que eleva o limite da renda familiar que habilita ao recebimento do Benefício de Prestação Continuada, o BPC. De autoria do senador Dalirio Beber (PSDB-SC), a proposta altera a Lei Orgânica da Assistência Social para considerar, como incapaz de prover sua manutenção, a pessoa com deficiência ou idosa, cuja renda mensal per capita seja inferior a três quintos do salário mínimo nacional - o equivalente, atualmente, a R$ 598,80. A matéria ainda irá à Comissão de Assuntos Econômicos. 

Cumpre, por fim, ressaltar o relevante papel que os programas assistenciais têm desempenhado no combate à pobreza e à miséria no Brasil, permitindo a garantia do mínimo existencial. Esses programas asseguram condições mínimas de dignidade a todos aqueles que, por serem idosos ou deficientes, não têm oportunidade de se inserir no mercado de trabalho. A existência digna deve ser algo comum a todos os indivíduos que não conseguem obter seus próprios recursos e do seu núcleo familiar, devendo ser amparados pelo Estado. Trata-se, portanto, da própria materialização do princípio da solidariedade, um dos pilares da Constituição Federal, em que a coletividade ampara aqueles que não detém as mesmas condições de competir no já escasso mercado de trabalho, em que não há sequer vagas para aqueles que detém plenas condições laborais.

Portanto, o tema acerca das alterações relativas ao BPC deve ser tratado com extrema cautela, pois a rede de proteção oferecia pela assistência social, na qual o BPC se encontra imerso, é direcionada para a camada mais necessitada da população. Assim, a concessão de um benefício, ainda que em valor mínimo, coloca esses cidadãos na qualidade de merecedores de atenção e de tratamento igualitário perante o Estado e às demais pessoas, garantindo condições existenciais mínimas para uma vida digna e saudável.

Por: Dra. Daniela da Silva - OAB/RS 108.111